Blog do Alex Ramos
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Tentativa de assalto terminou com o assassinato e motorista no Rio Foto: Guito Moreto / Agência O Globo - 24/10/2017 |
“Vítima”,
me informa o dicionário sobre minha mesa, é alguém que sofreu um dano, desgraça
ou infortúnio, ou alguém contra quem se cometeu um crime. Crime, aliás, é algo
que existe de sobra no Brasil, mesmo com as reduções dos índices que parecem
estar acontecendo este ano. Nos três estados mais populosos da federação — São
Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro — foram registrados 243 mil roubos entre
janeiro e maio de 2019. Dá uns 1.600 por dia. Pouco mais de um por minuto. E
isso são apenas os registros: não entram na conta os casos que nem passaram
pela porta da delegacia. Pelo padrão dicionarístico, as pessoas que foram
assaltadas são entendidas como vítimas. Pelo padrão policial/jurídico, idem. E
o criminoso, aquele sujeito que aparece como “autor” no registro de ocorrência?
Ah, esse é uma vítima da sociedade, foi empurrado para o crime pela
desigualdade social, a falta de oportunidades. Será?
Não
vou entrar na discussão se Jean-Jacques Rousseau estava certo ou errado ao
dizer que os homens nascem bons e a sociedade os corrompe. Nem analisar teorias
como o Labelling Approach. Ou sugerir a retomada das teses de Lombroso no
“L’Uomo delinquente”. Não sou sociólogo nem tenho estofo teórico para isso. A
questão, aqui, é mais numérica e prática. Se em apenas três estados da
federação há um registro de roubo por minuto — e não estamos falando de furtos,
estelionatos, estupros, homicídios, tráfico de drogas — isso leva a uma
constatação óbvia: tem muito bandido nas ruas e eles estão à vontade. Não se
pode dizer o mesmo dos infelizes etiquetados com o rótulo “vítima”.
Pobreza
não empurra ninguém obrigatoriamente para o crime. Fosse assim, teríamos um
roubo por décimo de segundo — além de ser um desrespeito às pessoas honestas em
geral e às pessoas honestas e pobres, em particular. Falta de oportunidade ou
desemprego, também não — os 13 milhões de brasileiros no desemprego e correndo
atrás de uma chance são a prova disso. Duvido ainda que haja uma correlação
entre banditismo e nível socioeducacional, cor da pele, orientação sexual,
endereço. Acho pouco provável que pessoas boas e de coração puro estejam tenham
sido levadas a botar armas na cara de outras pessoas e subtrair suas carteiras
pelo sistema capitalista selvagem. O que anaboliza o bandido é a certeza do
ganho e a baixa chance de ser pego — e, caso seja, a punição branda.
Quando
a polícia do Rio só abre um inquérito a cada 23
registros de roubo , isso significa na prática que o ladrão tem
96 chances em cem de escapar e nem ser identificado.
E,
mesmo quando o criminoso é punido, há sempre a mão carinhosa do Estado para
fazer um afago. Que o diga o senador Acir Gurgacz, condenado por crimes contra
o sistema financeiro, cumprindo pena em regime domiciliar e agora autorizado
pela Justiça a passar uns dias de
férias num resort no Caribe .
Eu
poderia dizer que isso é um escárnio, uma vergonha, mas direi que é apenas
reflexo de uma sociedade que louva Lampião, o Rei do Cangaço, um homicida e
ladrão, mas desconhece o nome do policial que o matou.
O
fato é que ninguém é bandido por esporte ou por necessidade. Quem escolhe o
crime como meio de vida é responsável pelo que faz e sabe que está fazendo algo
errado. Já passou da hora de a sociedade e o Estado tirarem as metafóricas
rodinhas da bicicleta e deixarem que cada um assuma seus atos e aguente as
consequências. Não dá é para continuar passando a mão na cabeça e tendo bandido
de estimação, esteja ele solto num morro ou preso numa cela da Polícia Federal
em Curitiba.
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